Núcleo Bartolomeu de Depoimentos estreia "Antígona Recortada"

Trazer para a cena atual, mais precisamente para a periferia de uma grande cidade do mundo, o mito de Antígona – clássica tragédia grega de Sófocles – utilizando o recurso do spoken word (poesia falada) como elemento motriz da encenação. Em síntese, esse é mote do novo espetáculo do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, “Antígona Recortada – Contos que Cantam Sobre Pousopássaros”, que estreia dia 1º de novembro, às 21h, no espaço cênico da sede do grupo, no bairro da Pompeia. 

O novo trabalho do Bartolomeu é totalmente ancorado em seu núcleo fundador: Claudia Schapira assina a dramaturgia e dirige as atrizes/MC’s Roberta Estrela D’Alva e Luaa Gabanini, enquanto o DJ Eugênio Lima responde pela direção musical do espetáculo e executa ao vivo a dramaturgia sonora. 

Reconhecido na cena teatral brasileira como pioneiro em unir o teatro épico com a linguagem hip-hop, o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos resolveu radicalizar ainda mais na sua proposta.  Desta vez, o grupo dá ênfase à palavra, utilizando como interface estética do trabalho o spoken word ou “poesia falada”, nome dado a performances em que os artistas recitam textos. 

“Neste trabalho, nós decidimos privilegiar um dos elementos do teatro hip-hop: a palavra. A ideia é mostrar como ela se materializa de diferentes maneiras, em distintas possibilidades de propostas cênicas, tendo como mote dramatúrgico o texto de um dos ‘dramaturgos-mestres’ da humanidade”, enfatiza o grupo. 

Depois da realização de “Orfeu Mestiço - uma hip-hopera brasileira”, mais recente espetáculo do grupo, a questão da terra, do pertencimento e do direito à vida retorna diferente: “Não mais no solo que nos carrega, mas no corpo-casa que habitamos. A terra é o corpo. E esse corpo tem direito a pouso vivo e morto”, explica Claudia Schapira.

Ela acrescenta que “partindo desta reflexão, duas antígonas recortadas, constituídas de partes desconexas, resultado direto de décadas em que a luta de classes e o tema dos direitos desenham a realidade brasileira direta ou subliminarmente, as duas cidadãs urbanas vão narrando a própria história em fragmentos, percorrendo diferentes épocas, evocadas pela dramaturgia sonora, que as arremessa numa linha temporal, onde os conflitos da trama são situados cada um,  em um emblemático momento histórico.

A peça é um poema de ações dramáticas, escrito a convite do projeto Conexões, uma parceria da Cultura Inglesa São Paulo, British Council Brasil, Colégio São Luís, National Theatre de Londres e Escola Superior de Artes Célia Helena. 

Tendo a tragédia Antígona como mote,  o espetáculo narra a trajetória de jovens meninas em alguma periferia de mundo, que diante do constante extermínio dos “irmãos envolvidos com o tráfico de drogas”, decidem uma ação de desacato, procurando em valas e buracos todos os corpos que não foram enterrados e dar a eles o devido repouso sob a terra.  Na sequência, criam uma “fresta no tempo” , uma zona autônoma temporária,  “um dia de poder ser criança” e de ter direito à poesia, levando todas as crianças para uma laje abandonada. “Um levante, que, diante da realidade em que vivem, se torna um instante diferenciado no tempo e no espaço’, completa a diretora.

O tema da “desobediência civil” é despertado mediante a ação dessas jovens que reivindicam o direito de enterrar seus mortos, como na tragédia original, evocando ainda a criação de “um outro mundo possível”, discutindo  o valor da vida/direito natural e a necessidade urgente de criar um novo imaginário.

“O verbo central está na voz narrativa das meninas-mães; as jovens filhas que desde cedo cuidam dos irmãos enquanto as mães trabalham para sustentar a família, em sua maioria sem pai”, explica a diretora Claudia Shapira.

“A dança de rua e novas manifestações culturais que arrebatam os jovens criando ‘um mundo próprio’ com regras próprias e características especificas, como o universo dos funkeiros e dos bailes funk, irão desfilar nesta encenação, refletindo sobre os motivos e as consequências dessas tendências arrebatadoras e polêmicas. A metáfora dos pássaros reforça o viés poético da narrativa que conta ainda com ideal humano de liberdade como grande pano de fundo”, completa Cláudia Schapira.  

Num espaço cênico delimitado, desenhado por microfones em pedestais e equipamentos de DJ, instaura-se uma “ágora-minimalista”, onde as possibilidades da palavra falada e cantada corporificam a ação, fazendo e desfazendo “mundos”, mesclando linguagens e construindo diversas formas de contracena. Tudo isso tendo as criações sonoras do DJ Eugênio Lima como fio condutor da narrativa. 

O grupo desenvolve, difunde e cria pesquisas de linguagem a partir da união do teatro épico com o hip-hop, resultando no Teatro Hip-Hop, um conceito pioneiro no Brasil que abre inúmeras possibilidades e campos de ação, dialogando com as tendências e diversidades das manifestações urbanas. 

Tendo a palavra, a oralidade, a música e a poesia como fios condutores da pesquisa,  ao longo desta uma década o Núcleo Bartolomeu participou dos principais festivais de teatro, entre eles: Cena Contemporânea, Filo e Teatralia (Madrid), e ganhou os prêmios Shell na categoria direção musical [Frátria Amada Brasil] e melhor espetáculo jovem prêmio Coca-Cola FEMSA [Cindi HipHop – Pequena ópera rap]. Com sede no bairro da Pompeia, ao longo do ano o grupo abre o espaço para que poetas, MC’s, DJs, fotógrafos, dramaturgos e atores se encontrem para celebrar a palavra, a oralidade e arte produzida na metrópole. 

O Núcleo Bartolomeu de Depoimentos é um entre os muitos dos herdeiros desta história e tem por fonte de pesquisa a união criativa entre o teatro épico do dramaturgo alemão Bertold Brecht  e a cultura Hip-Hop, tendo como resultado desta fusão uma linguagem estética baseada na auto-representação, na reflexão crítica e na diversidade das ruas, que é sintetizado na figura do ator-mc, proporcionando deste modo, uma ágora de contracena, o Teatro-Hip-Hop, no qual tanto a plateia/cúmplice quanto os Atores–Mc’s, abdicam do papel passivo da reprodução mimética para juntos construírem uma obra viva e dinâmica aonde a  rua é por definição o espaço  da liberdade.

 

Serviço:

Estreia: dia 1º de novembro

Temporada: até o dia 22 de dezembro

Horários: Sextas e sábados, às 21h e domingos, às 20h

Capacidade: 100 lugares

Duração: 90 minutos

Ingresso: contribuição voluntária, pague quanto puder

Bilheteria: abertura com duas horas de antecedência

Classificação: 12 anos

 

Núcleo Bartolomeu de Depoimentos

Rua Dr Augusto de Mirada 786, Pompeia

(11) 3803-9396 (11) 7737-9565

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