Está cada vez mais difícil precisar o quanto é essencial o uso da internet no dia a dia das pessoas, das empresas e das instituições. Parece clichê, mas tal necessidade abriu novo debate a respeito do acesso a essa tecnologia. Discute-se, atualmente, não só políticas eficientes de inclusão, já que o computador populariza-se em larga escala, mas, principalmente, os hábitos de comportamento para se conviver em harmonia com o mundo virtual. Isso porque a dependência da internet deixou usuários na corda bamba entre a necessidade e o vício. Afinal, o que não se pode fazer pela internet?
Alheios a essas discussões, desenvolvedores e produtores de conteúdo querem mesmo é criar soluções e novas ferramentas para otimizar tarefas diárias, disseminar informações e entreter.
A internet oferece um leque de possibilidades, seja para simplesmente convidar um amigo para uma festa ou mesmo assistir a uma peça teatral.
É isso mesmo. Já é possível assistir peças teatrais inteiras com exclusividade e ao vivo sem sair de casa. É preciso apenas ter uma boa conexão. Essa é a proposta inovadora de projetos como o “Teatro para Alguém” e a iniciativa da Companhia Silenciosa, de Curitiba (ver quadro). A classe teatral, que viu sua arte se espalhar através do site de vídeos You Tube, graças a personagens cômicos de grupos nacionais até então vistos apenas nos palcos, mostra que o mundo do teatro está de olho nas possibilidades oferecidas pela internet.
É a tecnologia como uma oportunidade de se divulgar e se aproximar do público. A democrática internet dá chance a qualquer um de conseguir seus 15 minutos de fama, o que torna a busca pela popularidade uma verdadeira batalha. Grace Gianoukas, idealizadora, diretora e atriz do espetáculo “Terça Insana”, um dos grandes sucessos da rede, acredita que a internet pode ser muito mais explorada. “Nós ainda descobriremos e inventaremos milhões de novos recursos.
Por enquanto, estamos diante do infinito, sem bússola. É a corrida do ouro. Quem chegar primeiro, ganha. Foi dada a largada, cada um corre para um lado e não sabemos para onde estamos nos encaminhando. Podemos achar ouro ou fezes..”, ironiza. Quando o site de vídeos YouTube surgiu, há quatro anos, era difícil imaginar que a sensação daquele momento pós-orkut, torna-se-ia todo o universo de oportunidades no qual se revelou. Rapidamente, ouro e fezes se espalharam pela rede. E no pote por trás do arco-íris estavam as esquetes teatrais. “Hermanoteu”, personagem da Cia de comédia Os melhores do Mundo, “Traficante Viado”, sucesso do grupo de stand-up comedy Deznecessários, e a “Irmã Selma”, a freira mau-humorada do espetáculo “Terça Insana”. Todos esses saíram dos palcos, acumularam milhões de acessos e uma legião de seguidores que divulgaram através de e-mails, blogs e sites outros trabalhos dos respectivos grupos.
Como consequência, salas de teatro lotadas a cada apresentação. A utilização da web e redes sociais para divulgação pelas companhias, grupos e produções teatrais aumenta a cada dia, seja por orkut, facebook, myspace etc.
No ano em que a internet completou 40 anos de existência (a data foi comemorada no dia 2 de setembro), a novidade é o Twitter. Estima-se que 15 milhões dos 1,5 bilhão de usuários de internet do mundo já se renderam à proposta do microblog: responder a simples pergunta “O que você está fazendo?” em 140 caracteres.
O Twitter popularizou-se rapidamente não só por ser um diário virtual, mas, também, por ser um espaço para apresentar ideias e ideais. O sucesso na internet não é uma exclusividade das stand ups e grupos de comédia. Amadores, artistas, teatros e companhias iniciantes também usam de sites e redes sociais para auto promoção.
E a coisa dá certo. A atriz Maria Alice Vergueiro, por exemplo, virou hit com sua atuação no polêmico vídeo “Tapa na Pantera”, na qual a veterana artista expõe uma suposta relação com o uso da maconha. Em entrevista ao Jornal de Teatro, em junho, Maria Alice deixou clara suas intenções com o vídeo, além de colocar em debate um dos grandes males do mundo virtual: a incerteza quanto a veracidade dos conteúdos. “Eu vi que ninguém estava interessado na maconha. Pensei que eu ia pegar toda essa moçada interessada na maconha, mas não. A maior parte das pessoas estava na dúvida se eu era atriz ou se a personagem era real, se eu era a personagem. Porque, até então, o YouTube estava hospedando vídeos da festinha de aniversário do filho, aquela coisa... E eu trouxe algo mais elaborado. Ou então parecia que realmente era um flagrante meu. Eu mesma comecei a discutir o que era ser atriz para mim”, revela Maria Alice.
Fugir dos fakes – perfis falsos – e das informações incorretas é o grande desafio imposto pela web. Buscar fontes seguras e selecionar o conteúdo é o caminho para não pisar nas “fezes”. A atriz Jussara Freire sabe bem o que é isso. No Wikipédia, a enciclopédia virtual, sua biografia consta que ela é natural de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Jussara, no entanto, afirma que é paulista. “Muita gente acha que isso é verdade e se pauta pela informação que está na net. Não sou matogrossense”, diz. Cada um no seu quadrado Dentro do vasto universo oferecido pelas mídias sociais, cada um elege o recurso virtual mais adequado ao seu objetivo. E tem quem prefira todos.
O grupo Ato de Teatro-Educação de São Paulo encontrou no Orkut um ponto de encontro entre os atores, além de ter um feedback de suas produções. “As principais notícias e acontecimentos a que os atores devem estar a par invariavelmente nos chega, primeiramente, por Orkut. Recentemente, decidimos iniciar um blog no qual pudéssemos apresentar um pouco mais a respeito do grupo. A proposta é, além de servir como um meio de divulgação rápido e permanente, depositar um pouco da vivência de cada ator, conforme o processo de criação se dá e surge a disponibilidade de se testemunhar, por escrito, e disponibilizar para a comunidade. Também como um espaço para divulgar fotos e vídeos que possam auxiliar a documentação da trajetória do grupo”, conta a diretora Ana Cláudia Segadas. Eles também utilizam o Youtube.com e o Twitter. Já a Companhia Barbixas de Humor, que realiza o espetáculo Improvável, um dos campeões de acesso atual, também creditam o sucesso nas bilheterias ao YouTube. “Usamos muito o site. Atualmente, é a nossa ferramenta mais forte. Mas também usamos o nosso site, mailing... O YouTube faz com que as pessoas vejam um pouco do nosso trabalho antes de ir ao teatro. No site as pessoas conhecem a gente um pouco mais”, explica Daniel Nascimento, um dos membros da trupe.
Terça Insana: mix de ações virtuais Sucesso nos palcos e na web, “Terça Insana” viu a popularidade dos seus personagens e integrantes expandir-se com a chegada do Youtube. Segundo Grace, o Terça não é só um espetáculo de humor. Ela esclarece que o Terça Insana possui três frentes de trabalho e cada uma delas usa ferramentas de internet diferentes: Projeto Terça Insana, a Terça Insana Produções Artísticas e o show Terça Insana. “Para quem se interessa pelo nosso trabalho e quer ter acesso às informações originais sobre o que é o Projeto Terça Insana, é só acessar nosso site oficial (www.tercainsana.com.br). Lá, é possível encontrar toda a nossa história, os objetivos, as diretrizes e a abrangência do campo de atuação do Projeto. As empresas interessadas em oferecer patrocínio ou em contratar nossos shows também podem conhecer a fundo nossa proposta artística e de entretenimento”, frisa. Ela explica que a parte executiva é a Terça Insana Produções Artísticas que, segundo a diretora, não sobrevive sem a internet.
A ferramenta auxilia na troca de informações e no fechamento de contratos. Já o show Terça Insana é o espetáculo em si, onde os personagens podem ser vistos, ao vivo. “A equipe de criação do show utiliza a internet como ferramenta de pesquisa de conteúdo, na busca de referências e resgate de tesouros culturais que auxiliam na formatação dos espetáculos da trupe, que se renovam a cada mês”, acrescenta. Grace atribui o sucesso das esquetes do grupo na internet ao lançamento do primeiro DVD que, coincidentemente, saiu no período em que o Youtube se tornava febre entre os usuários. “São ações que tiveram total iniciativa dos fãs da Terça Insana, sendo que muitos têm o universo virtual como uma extensão natural de suas vidas.
É a maneira que algumas pessoas encontram para prestigiar seus ídolos, de mostrar aquilo que admiram para os amigos, não importando em que parte do mundo este amigo esteja. A Terça Insana entende que isso é um processo natural, pois o relacionamento do público com o artista mudou radicalmente com a ascensão da internet. A mensagem que o público transmite com estas atitudes é que não há mais espaço para intermediários neste ramo e, se algum profissional ainda almeja viver de arte e entretenimento, terá que rever uma série de paradigmas e se adaptar às novas ferramentas que a grande rede oferece”, encerra. Jornal de Teatro no twitter O twitter é a bola da vez do mundo virtual e uma febre que não para de crescer no Brasil.
Produções teatrais, grupos e artistas aderiram ao bloguinho e apresentam, em primeira mão, suas agendas e trabalhos. O Jornal de Teatro também está no twitter e possui, atualmente, cerca de 1200 seguidores que recebem o link das matérias no site oficial da publicação – www.jornaldeteatro.com.br. Para a equipe do jornal, o Twitter ainda tem outra função. Esta reportagem, por exemplo, utilizou alguns personagens e grupos contactados através do microblog. Por isso, não deixe de seguir o Jornal de Teatro e, quem sabe, colaborar em nossas próximas edições. www.teatroparaalguém.com.br O
“Teatro para Alguém” é a experiência mais complexa e integrada quando se trata de teatro e internet. Criado pela atriz, autora e diretora Renata Jesion, o site disponibiliza espetáculos para serem visualizados a qualquer hora e de qualquer lugar, gratuitamente. É a personificação da ideia de ir ao teatro sem sair de casa. Ou melhor, entrar na casa. O site foi formatado como uma casa e os espetáculos se dividem entre os cômodos. Com apenas dez meses de vida, o site já recebe cerca de 800 visitas por dia. Em tempos de estreia, esse número pode chegar a duas mil. Aproximadamente, 500 pessoas acompanham as apresentações ao vivo.
Na última sexta-feira foi a estreia de “Melhor que a Clarisse Lispector”, de Heloisa Pait. As produções permanecem em cartaz durante um mês. Mas o internauta pode acessar peças que já saíram de cartaz. É só ir até o porão da casa, onde as apresentações ficam armazenadas. Experiência ao vivo O ator Elias Andreato estreou no teatro virtual seu espetáculo solo “Doido”, em setembro, em apresentação ao vivo. Foi a primeira vez que uma peça esteve em cartaz no palco real e virtual. Grupo curitibano exibe espetáculo ao vivo na internet A Companhia Silenciosa, do Paraná, é mais uma a utilizar as novas tecnologias para levar a sua arte para o maior número possível de expectadores. Tanto que o grupo, que realizou uma polêmica e divertida participação no Festival de Curitiba, em março deste ano, estreia, no próximo dia 13 de novembro – no palco e na web –, o espetáculo Burlescas.
Trata-se de uma releitura da trajetória do Teatro Burlesco – apresentação teatral que consiste em uma paródia ou sátira – através dos tempos. Na montagem, um espetáculo multimídia, com ingredientes de crítica social, ironia, reflexão e entretenimento em performances de dança, esquetes, projeção de vídeo e música eletrônica. “É uma revisitação do burlesco. O espetáculo segue a história desse estilo teatral e ganha características nacionais, como o teatro de revista e o teatro de rebolado, até chegar ao que temos nos dias de hoje”, explica Léo Glück, um dos atores do projeto. A Companhia Silenciosa faz parte do Movimento de Teatro de Grupo de Curitiba e desenvolve um ambiente de pesquisa e produção artística que se tornou referência no teatro do sul do Brasil.
A peça inédita e com seis horas de duração será apresentada no Espaço Cultural 92 Graus (rua Desembargador Benvindo Valente, 280) e contará com transmissão simultânea através da página da trupe na internet (www.companhiasilenciosa.com). O espetáculo será em novembro, nos dias 13, 20 e 27 e em dezembro (dias 12, 17 e 19), sempre a partir das 23h. Por Douglas de Barros.