Longe das salas de espetáculo, os diretores, produtores e atores podem encontrar questões mais complexas que a interpretação. Há diversos processos e brigas judiciais que acontecem por divergências entre os contratantes e os contratados. Problemas que envolvem direitos autorais, por exemplo, pedem a interferência de advogados especializados no assunto. O advogado Marcos Alberto Sant’Anna Bitelli é mestre e doutorando em Direito pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), coordenador e professor do curso de pós-graduação “Comunicação e Direito” do IICS (Instituto Internacional de Ciências Sociais) e ministra cursos de especialização em Direito para entretenimento, lazer e cultura. Especialista no assunto, Bitelli explica quais são e os motivos que acarretam em processo e qual a situação dos advogados nessa área.
Jornal de Teatro – Quais os principais processos judiciais que acontecem na área teatral?
Marcos Bitelli – O direito do entretenimento é um segmento que cuida de todos os aspectos contratuais relacionados ao negócio. Envolve, também, a solução de litígios. As principais disputas estão, via de regra, relacionadas a direitos autorais, de imagem, de distribuição e de produção. O setor de teatro não tem um histórico muito significativo de litígios, até porque a formatação das produções facilita um pouco a vida de todos. No teatro, o envolvimento de quem produz com o elenco, com o diretor e com a captação dos recursos, como a logística e as tournées, é mais direto e, portanto, cria uma pessoalidade que ainda permite uma razoável zona de conforto.
JT – Quais são os assuntos mais recorrentes?
MB – Os que dizem respeito à regulação da relação do trabalho do artista de forma autônoma ou subordinada, os contratos com os talentos, a obtenção dos direitos de adaptação das obras para peças teatrais, quando obras derivadas, os ajustes com diretores, cenógrafos, figurinistas e criação de luz. O mais importante é que existem também temas que não sejam da porta para dentro do teatro, mas igualmente relevantes, como os contratos com os proprietários das casas de espetáculos, com as empresas que vendem ingressos e as brigas com a questão da meia-entrada absurdamente concedida por várias leis e que conspiram para a sustentabilidade do teatro como negócio, como empreendimento. Além disso, surge sempre a complexa relação com a indústria da música, desde os direitos com compositores e gravadoras, até o tradicional embate com o Ecad na cobrança dos direitos autorais da comunicação pública.
JT – Os advogados especializados em cultura estão preparados para atuarem em casos como esses?
MB – O primeiro ponto é que esta especialização não pode ser chamada de “cultura”. Combato muito esta expressão “produtor cultural”, “advogado cultural”, “evento cultural”. Ela traz, em si, um viés muito específico e sob certo aspecto elitista. Os setores de entretenimento, comunicação e lazer podem ser geradores de expressões que serão reconhecidas como “cultura” enquanto movimento, mas “cultura” não é uma coisa que se produz, mas que se reconhece com o passar do tempo. Assim, o direito relacionado à cultura é aquele que se liga à preservação dos valores culturais já estabelecidos na sociedade brasileira e, aí sim, pode-se falar em especialização. O que venho tentando nos últimos anos, através de cursos e palestras, é trazer para os profissionais dos diversos setores relacionados ao entretenimento e ao lazer um conhecimento específico de todas as incidências legais e práticas jurídicas de cada atividade, bem como seu inter-relacionamento com as demais especialidades, como direitos do consumidor, da infância e adolescência, contratos, direito de autor e regulação, tratadas pela Ancine, Anatel e Ministério das Comunicações, entre outros. Hoje há a necessidade de um conhecimento de convergência das mídias, inclusive as tradicionais com as digitais.