Política na cena porto-alegrense


Breno Ketzer Saul, coordenador de artes cênicas da Secretaria Municipal de Cultura, sobe ao palco e fala sobre as ações na cidade

Por Adriana Machado

Na coordenação de artes cênicas da Secretaria Municipal de Cultura desde fevereiro deste ano, Breno Ketzer Saul tem uma relação de duas décadas com o teatro. Começou na iluminação, fez pesquisas corporais no treinamento do ator e trabalhou com importantes encenadores gaúchos. No serviço público, ele salienta a importância do desafio. “Não é o cargo que me interessa, o que me interessa é o conteúdo”, diz. Em entrevista ao Jornal de Teatro, Breno falou sobre a instituição e a permanência de políticas e projetos desenvolvidos para a classe em Porto Alegre.

Jornal de Teatro – Quais ações a Secretaria Municipal de Cultura tem feito a favor do teatro?
Breno Ketzer Saul – Temos vários projetos na área do teatro em Porto Alegre. A coordenação de artes cênicas desenvolve, por exemplo, o Prêmio de Dramaturgia Carlos Carvalho, que incentiva a produção de textos teatrais; o Prêmio Açorianos e Tibicuera de Teatro Infantil, que valoriza os artistas locais. Além disso, sustenta três teatros (o Renascença, o Teatro de Câmara e a Sala Álvaro Moreyra), subsidiados e responsáveis por dar condições razoáveis para os atores desenvolverem seus trabalhos. Nestes espaços são disponibilizados iluminação, sonorização e equipamentos básicos. Os preços são bem razoáveis e cobradas taxas mínimas, que variam entre R$ 45 e R$ 70 por dia. O edital de ocupação das casas é feito através de um concurso público, no primeiro e no segundo semestre.

Jornal de Teatro – Há, também, o Funproarte, certo?
BKS – Certo. Trata-se de um projeto de fomento de incentivo à produção artística, que patrocina espetáculos, também por meio de concurso público, duas vezes ao ano. Outro projeto de ocupação de espaço é o Usina das Artes, realizado na Usina do Gasômetro, onde os grupos estão autorizados a utilizar uma sala por um ano. Ali, funcionará o território cultural e de criação destes artistas. O local também pode ser usado para guardar os materiais, como base de operação, de apresentação e de ensaio. A secretaria possui, ainda, o projeto Novas Caras, de incentivo a novos talentos surgidos na cena. Eles recebem ajuda de custo e se apresentam em determinadas datas nos teatros municipais. Fizemos homenagens, uma delas a Augusto Boal, e faremos leituras dramáticas dos textos da gaúcha Vera Karam. 

JT –  O Porto Alegre em Cena também está inserido nestas ações?
BKS – Sim. É um projeto que já tem 16 anos, coordenado por Luciano Alabarse. Traz produções mundialmente importantes de teatro, de dança e de música aos palcos de Porto Alegre, o que contribui para desenvolver as nossas artes cênicas, o nosso entendimento da arte. É importante ressaltar a qualidade que o Porto Alegre em Cena agregou aos nossos espetáculos e a nossa subjetividade. Algo importante para os nossos artistas, para os técnicos e para a comunidade também.
 
JT – E como funciona a descentralização dos espetáculos em Porto Alegre?
BKS –  A coordenação de artes cênicas fez uma mostra de teatro fora do eixo, com espetáculos montados na periferia da cidade. Percebemos que existe uma produção muito centralizada e precisamos mostrar o que é feito em termos de artes cênicas nos bairros mais afastados das oportunidades. A descentralização cultural promove oficinas de música, de teatro, de artes plásticas, de cinema e de dança. Acho esta ação importante para as comunidades que vão desenvolver trabalhos e se colocar de forma ativa no processo de criação. As pessoas não podem se colocar só como consumidoras de cultura, o ideal é que elas também produzam cultura. Mas veja só, nossa ideia não é distribuir cultura, mas fomentá-la.

JT – Qual a principal demanda da classe em Porto Alegre?       
BKS – A classe precisa de mais espaços para apresentações. A gente percebe isto pela enorme procura dos teatros municipais. A secretaria está construindo o Elis Regina, que ficará pronto em 2010. Outra demanda é o investimento nas produções artísticas. Um passo importante foi a aprovação da Lei de Fomento de Teatro e Dança, dia 29 de junho, na câmara de Porto Alegre. Isto é um incentivo importante e diferente, que não vai só incentivar produções pontuais, mas todo o processo criativo. Os grupos têm de ter recursos para produzir e sobreviver ao longo do ano.

JT – E como o fomento poderá estimular o trabalho destes grupos?
BKS – Eu acho que existe o teatro comercial, que consegue sobreviver de uma relação bem clara entre custo e benefício, e o teatro onde a preocupação maior não é o lucro por si só. Esta forma de arte deve ser incentivada principalmente pelo Estado. O fomento é fundamental para dar condições aos artistas de produzir. Condições financeiras e físicas. Hoje, as pessoas que trabalham com o teatro têm de fazer muitas atividades para sobreviver: dar aulas e ter outros empregos. Aliás, esta é uma realidade brasileira e mundial. Com recursos, a comunidade artística poderá se estruturar melhor, receber um salário, ganhar por ensaio e ter transporte. Claro, ninguém ficará rico com isto, mas são condições necessárias. As pessoas trabalham muito por amor ao teatro. Se colocarmos na ponta do lápis, elas não ganham pela dedicação, ou ganham muito pouco. O fomento protege todo o ciclo de criação e não um projeto pontual.  
 
JT – Com a sua experiência no meio, como você definiria o teatro gaúcho?
BKS – O teatro gaúcho não tem um traço específico. Acho que tem altos e baixos, excelentes espetáculos, e outros não tão bons. Temos grupos importantes, com trabalhos consistentes ao longo do tempo, e aquelas produções esporádicas. Enfrentamos muitas dificuldades financeiras, que determinam a forma das suas produções. Nós estamos muito atrelados ao modelo voltado para pessoas globais, muito influenciado pela telenovela. Mas também temos criadores importantes na cena. Alterna bons momentos com maus momentos. E os maus momentos podem ser melhorados com o incentivo, a estrutura e o investimento em espaços e recursos.

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